Economia

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5. Aspectos bioecológicos das cigarras na cultura do cafeeiro

                As cigarras são insetos robustos encontrados nos trópicos e subtrópicos. Pertecem à ordem Hemiptera, a superfamília Cicadoidea e família Cicadidae, que é dividida nas subfamílias Cicadinae, Cicadettinae e Tettigadinae (MOULDS, 2005). São caracterizadas por possuírem um complexo órgão para a produção e recepção do som (CARVER; GROSS; WOODWARD, 1991). O órgão produtor de som é de grande importância na taxonomia desse grupo, sendo que a classificação das famílias e subfamílias é baseada nas estruturas associadas a esse órgão.
                No Brasil, as espécies Quesada gigas, Quesada sodalis, Fidicinoides pronoe, Fidicina mannifera, Fidicina pullata, Dorisiana drewseni, Dorisiana viridism Carineta fasciculata, Carineta matura, Carineta spoliata (MARTINELLI; ZUCCHI, 1997), Fidicina viridifemur (MARTINELLI; MACCAGNAN; PEREIRA, 2010) e Fidicinoides sarutaiensis (SANTOS et al.,2010), são citadas tendo o cafeeiro como hospedeiro. Entretanto, essas cigarras apresentam uma distribuição muito ampla, pois o cafeeiro não é o único recurso trófico das cigarras, muito embora os hospedeiros de cigarras sejam pouco conhecidos.
                A biologia das cigarras no Brasil ainda é pouco conhecida, provavelmente devido à dificuldade de realizar pesquisas com estes insetos em condições laboratoriais. Para ter conhecimento sobre a duração da fase imatura da espécie Q. gigas, iniciou-se um estudo de biologia através da infestação artificial desta espécie em plantas de cafeeiro, protegidos por tela, na FCAV-UNESP, Câmpus Jaboticabal, em 2009. A partir daí, realizam-se pesquisas a fim de aumentar o conhecimento sobre esta importante espécie de cigarra para cultura do cafeeiro.
                Desta forma, Maccagnan et. Al (2011) confirmaram a viabilidade de infestar artificialmente ninfas de primeiro instar de Q. gigas em plantas de cafeeiro, e Kubota et al. (2011) observaram que, após 19 meses do início da infestação, as ninfas encontravam-se no quinto instar. Pachas (1966) realizou um estudo sobre o período de desenvolvimento da espécie de cigarra neotropical F.mannifera na Argentina, tendo como hospedeiro a erva-mate, no qual constatou quo período da fase de ninfa móvel foi de seis anos.
                No Brasil, a espécie mais prejudicial ao caffeiro é Q. gigas, que infesta principalmente plantios de Minas Gerais e São Paulo (MARTINELLI; LUSVARGHI, 1998). Sua emergência é iniciada em meados de setembro, prolongando-se até meados de outubro, sendo que o pico de saída de machos ocorre cerca de 10 dias antes das fêmeas (MACCAGNAN, 2008). Após o acasalamento, as fêmeas colocam os ovos endofiticamente nos ramos secos (MARTINELLI, 2004), localizados preferencialmente no terço superior das plantas de café. Cada fêmea oviposita, em média, 300 ovos, sem, em média, 12 ovos por local de oviposião (DECARO JUNIOR, 2008).
                Após a eclosão, as ninfas móveis de Q. gigas penetram no solo e locomovem-se no subsolo através da escavação de galerias. Seu primeiro par der pernas é modificado para esse fim e possui grande valor taxonômico (MACCAGNAN; MARTINELLI, 2004). As ninfas passam por cinco instares fixadas nas raízes das plantas de cafeeiro, sugando a seixa do xilema onde podem ser encontradas até a profundidade de um metro. Terminada a fase móvel, as ninfas abandonam as raízes e saem do solo através de orifícios cilíndricos, fixando-se nos troncos das planta (MARTINELLI, 2004).
                Devido a sucção contínua da seiva pelas ninfas, as plantas apresentam uma clorose nas folhas da extremidade dos ramos, semelhante a deficiência nutricionais. O cafeeiro sofre definhamento progressivo, ocorre a queda prematura de folha, flores e frutos, as extremidades dos ramos secam, causando sensível diminuição de produção (GALLO et al., 2002). Além do cafeeiro, Q. gigas foi constatada causando dano na cultura florestal do paricá (Schizolobium amazonicum), nos Estados do Maranhão e Pará, onde causa morte do hospedeiro quando em alta infestação (ZANUNCIO et al., 2004).
                A forma eficiente de se controlar cigarras é a aplicação de inseticidas sistêmicos no solo (MARTINELLI et al., 1998), o que acarreta em custos elevados. Com isso, surgem novas alternativas de controle como o uso de controle biológico e controle microbiano. As pesquisas recentes envolvem a utilização de fungos (Massopora cicadinae e Metarhizium anisopliae), nematoides (Heterorhabditis sp., e Steinernema riobrave) e o uso de armadilha sonora, controle através do comportamento da cigarra.

6. Armadilha sonora para controle de cigarras Quesada gigas em cafeeiro
                Por meio de estudos de sons enutidos pela espécie Q. gigas, foi possível desenvolver uma “isca sonora” que atrai grande quantidade dessas cigarras, tanto fêmeas como machos (MACAGNAN, 2008). Como o canto do acasalamento é próprio para cada espécie, a armadilha atrai somente as cigarra das espécies Q. gigas, não interferindo com nenhuma outra espécie de insetos. A armadilha emite o som que atrai centenas de cigarras, que, ao serem atraídas em direção à fonte emissora do som (alto-falantes), recebem a pulverização de uma calda inseticida que é coletada e redirecionada aos bicos de pulverização. Uma das grandes vantagens da armadilha está no aspecto ambiental, pois ela atua apenas sobre a espécie-alvo, e o inseticida não é aplicado no ambiente.
                A armadilha é deslocada em baixa velocidade, em uma carreta, tracionada por um trator. Como o som atrai as cigarras a até 80 metros, a passagem consecutiva da armadilha poderá estar distanciada em até 160 metros, tratando mais de 100 hectares por dia. Essa operação deverá ser repetida todos os dias durante o período de emergência dos adultos.
                O uso da armadilha deve ser iniciado nos meados de setembro, quando a população é predominantemente de machos e ainda não se ouve o canto das cigarras. Nessa época, grande número de machos já emergiu e estão à espera da emergência das fêmeas e ainda não há “cantoria” das cigarras, mas o som da armadilha é capaz de atrair essas cigarras, poucas fêmeas e muitos machos. O uso sistemático da armadilha nessa época faz com que em torno do dia 20 de outubro já não encontre mais cigarras no cafezal, enquanto em outras lavouras é possível ver esses insetos até por volta de 10 de novembro ou até mais tarde, nas condições de sul de Minas.
                Em propriedades que utilizaram a armadilha por três anos consecutivos, o nível de infestação decresceu bastante, a ponto de dispensar os tratamentos químicos convencionais. Comparado ao custo do método convencional de se utilizar inseticidas no solo, o uso da armadilha tem custo incomparavelmente mais baixo. Basta comparar o custo dos inseticidas em 100 hectares durante cinco anos (vida útil da armadilha sonora) contra o custo de aquisição de uma armadilha. O total de horas de serviço do trator para operação da armadilha é muito próximo ao da aplicação do inseticida convencional, que deve ser aplicado “rua por rua”, ao passo que a armadilha passa a cada 160 metros. As vantagens associadas ao uso da armadilha sonora, quais sejam a incomparável economia, a seletividade absoluta e a preservação do ambiente, credenciam esse método como um instrumento indispensável para a sustentabilidade da cafeicultura moderna.

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